segunda-feira, 18 de março de 2013

INFELICIANOS

 
 INFELICIANOS
Suely Pavan Zanella
"Sou mau porque sou infeliz", responde a criatura feita de retalhos ao seu criador, Victor Frankenstein. O livro Frankenstein (Frankenstein: or the Modern Prometheus, do original inglês) foi escrito em 1818 por Mary Shelley, filha de Mary Wollstonecraft, filósofa e uma das primeiras feministas. No livro, Mary nunca deu um nome a esta criatura monstruosa, mas popularmente Frankenstein ficou conhecido como o monstro e não como o seu criador.

Porém, o foco aqui, após este preâmbulo, é a frase da criatura: "Sou mau porque sou infeliz". Fernando Sabater, em seu livro Ética para Meu Filho, diz que se todos os maus do mundo pudessem ou tivessem coragem para dizer por qual razão são maus diriam que são infelizes, se fossem sinceros!

Os infelizes fazem muito mal aos outros. E o motivo é simples: eles não são éticos. E ética significa "a arte do bem viver". E viver bem é querer uma boa vida para todos, independentemente de religião, sexo, cor ou orientação sexual. Ser ético assegura direitos para todos, e foi assim que foram criadas as polis, ou as cidades, segundo Aristóteles.

Felicidade também não é fazer o que se quer, ou aquilo que se deseja, como por exemplo, beber e depois dirigir. Isto é criancice, e falta de ética. Aliás, o ser ético de verdade nem sequer precisaria de leis ou da moral, pois saberia, pelo simples fato de ser ético, que algumas ações prejudicam as outras pessoas. Jamais mataria, pois isto fere a espécie humana. Jamais mentiria, pois mentir também trai a palavra que é humana. Subiria em uma montanha e sem vergonha alguma assumiria perante todos aquilo que faz da vida. Assim são os seres éticos. Eles refletem sobre a moral existente.

Não são críticos e muito menos moralistas, apenas refletem aquilo que está ao redor, ampliando caminhos e possibilidades. Buscam a felicidade alheia, assegura através dos mesmos direitos a todos. Vida digna tem muito a ver com ética.

Os piores inimigos da ética, e consequentemente dos direitos, são os puritanos, os infelicianos. Fuja deles!

Savater em seu livro conta o exemplo sobre o que são os puritanos:

...Ela liga para a polícia reclamando de que havia alguns rapazes nuns tomando banho na frente de sua casa. A polícia afastou os rapazes, mas a mulher voltou a telefonar, dizendo que eles estavam tomando banho (nus, sempre nus) um pouco mais acima, e que o escândalo continuava. Mais uma vez a polícia os afastou, mas a mulher voltou a reclamar. "Mas, minha senhora"- disse o delegado – "nós os afastamos para mais de um quilômetro e meio de distancia..." E a puritana respondeu "virtuosamente" indignada: "É, mas de binóculo ainda consigo enxergá-los!"...

Assim são os infelicianos, eles sempre implicam com o prazer e a alegria alheias. Sentem-se incomodados até com as peculiaridades que fazem parte única e exclusivamente da intimidade das pessoas.
Quando nos aliamos aos infelicianos da vida estamos a caminho do regresso da ética. Ética é algo humano, já que não somos bicho que repete comportamentos. Somos dotados de pensamento e emoções, capazes de mudar o mundo.

Quando vejo pessoas de fato alegres e felizes (não confunda com felicidade plástica ou com a ditadura atual para ser feliz), percebo que o mundo caminha de forma leve e fluída e que estas pessoas por assim serem fazem muito mais bem do que mal ao seu próximo.

São colaborativas, dirigem bem, estacionam corretamente, respeitam as leis e são pouco puritanas. E lidam de forma saudável com seus conflitos e tristezas.

Visam uma boa vida para si, e querem a felicidade alheia. Gente feliz dá bem menos trabalho. Quanto aos infelicianos, o melhor a fazer é deixá-los de lado. Alguns deles simplesmente resolveram que não querem ser felizes e se incomodam com a felicidade alheia.

Todo infeliciano não pode ver ninguém bem, e só quer tornar todo mundo igual (igual a eles).

Lutar pela própria felicidade é uma maneira bem saudável de colocar os infelicianos, puritanos e inimigos da ética em seus lugares.

Desfrutar de prazer, viver bem, ter amor pelas pessoas, fazer o bem, e perceber que apesar de diferentes somos todos humanos, são coisas que não se adequam aos infelicianos. Eles vivem a olhar os homens nus a quilômetros de distância. Assim são os fracos e frágeis, que precisam controlar o comportamento alheio através de regras infundadas baseada na moral criada por eles mesmos, porém jamais na ética.