segunda-feira, 25 de junho de 2012

MENINAS BRIGUENTAS

MENINAS BRIGUENTAS

Suely Pavan Zanella
Quando eu era pequena eram os meninos que adotavam um comportamento brigão. Não eram todos, aliás, eram sempre os mesmos que estavam dispostos a não levar desaforo pra casa e partiam para a briga. Mães eram chamadas pela diretoria da escola para lidar com seus rebentos. Meninos brigões não eram bem vistos, e lembravam aquelas gangues que víamos apenas nos filmes americanos repleto de brigas entre adolescentes. Tanto nestes filmes, como na realidade as meninas eram apenas coadjuvantes.  Meninas, nesta época, pareciam seres mais doces, e menos voltadas para encrencas.
Há cerca de 10 anos conversando com o diretor da escola particular na qual meu filho estudava ele me contou, bastante surpreso, que um novo comportamento despontava entre as meninas: Elas estavam brigando feiamente. Brigavam por causa dos meninos e estavam preferindo namorar com pequenos traficantes.
E ele, o diretor, não sabia o que fazer. Sugeri que ele chamasse os pais. Ele me disse que sempre que acontecia um episódio destes envolvendo meninas e também meninos ele chamava os pais. E que eles ou não compareciam à escola, ou defendiam seus “filhinhos” com unhas e dentes. O culpado era sempre aquela que era agredida, jamais, sua filha, que segundo eles apenas respondia a uma agressão.
Faz mais ou menos este tempo que as meninas começaram a se tornar bastante agressivas. Batem boca, e brigam fisicamente se acharem que isto resolve. Não foi apenas este comportamento que mudou, há uma série de outros que não cabe comentar neste contexto. Mas quem trabalha com crianças e adolescentes diz que mudou tudo: o que no passado era comportamento dos meninos hoje é delas, inclusive as brigas.
Como o Brasil não tem estatísticas e muito menos pesquisas acadêmicas à respeito, não sei dizer a proporção deste aumento da agressividade das meninas em relação aos meninos. Muitas escolas são omissas, e para não perderem clientes – alunos – deixam de registrar e até de comentar estas agressões. Algumas aparecem apenas nos dados das escolas públicas, dando a falsa impressão que nas particulares este comportamento inexiste ou é menor. O que não deixa de ser uma grande mentira, apenas para não se perder alunos. Afinal escola é um negócio, e quando o aluno é tratado como cliente, comportamentos abusivos não são mencionados.
Tanto meninas como jovens mulheres hoje são mais agressivas em todos os sentidos. E numa sociedade permissiva como a nossa, onde tudo é justificado, onde a justiça é lenta como uma tartaruga, comportamentos deste tipo tendem a piorar e aumentar. Até que tenhamos um homicídio dentro da escola e este servirá de emblema para uma campanha, ou qualquer outro tipo de alerta reativo, como sempre.
Há de modo geral, e não apenas no comportamento das meninas uma tendência:Resolver as coisas na base do grito ou da pancadaria. Parece que o ser humano está deixando de lado uma característica humana: A conversa, e com ela a negociação de comportamentos.
Outra coisa que noto são as explosões. A fulana aguenta ser chamada de gorda, ser insultada porque não tem namorado, e um dia explode e parte para a pancadaria. Não é assertiva. Não sabe colocar limites quando as pequenas agressões começam. Li uma vez que limites se colocam com pequenos golpes de karatê verbais.
Mesmo quando a menina sabe colocar limites há também uma tendência limítrofe, ou seja, o outro ou os outros só sabem respeitar quando o limite se dá em forma de gritos ou socos, ou ainda os famosos puxões de cabelo entre as meninas.
Trabalhei como voluntária numa ONG fazendo um trabalho de sexualidade com adolescentes e fiquem pasma ao ser cobrada a todo o momento por parte da dona do local de que eu precisava gritar, já que todas as professoras gritavam com os alunos para serem  ouvidas.
Autoridade na base do grito já é uma agressão. Agressão física para os alunos que têm seus ouvidos afetados, e verbal, já que a comunicação não se estabelece por meio de berros.
Em minha visão de psicóloga experiente o que há é uma crise quase geral de autoridade (pais, professores e estado).
Se tenho que usar, por exemplo, o grito para poder me fazer respeitar em sala de aula e se estabeleço este “modus operandi” junto ao alunos: Como me farei respeitar pelos mesmos? E que tipo de educação estou transmitindo? Que preparo têm os professores para lidar com estas novas demandas em sala de aula?
Nas cenas que vi de agressões feitas por meninas em vídeos, em nenhuma delas aparece um professor. Onde ele estava?
Até que ponto o diretor da escola dá aporte para os professores, afinal ele é a autoridade máxima dentro do ambiente escolar para prevenir brigas e incidentes piores? Ele se omite para não perder alunos? Ele pune, suspende, toma alguma ação exemplar, ou deixa para lá, e tenta tratar os jovens de hoje como os de antigamente?
E os pais o que andam fazendo para lidar com seus filhos agressores e submissos? Colocam limites usam de seu papel, ou confiam e acreditam em tudo o que seus filhos contam?
E o próprio jovem: Como usam a sua própria autoridade pessoal para lidarem com os impasses da vida? Como aprendem a resolver problemas? Que cursos participam para aprender a lidar na prática com isto? Que tipo de psicoterapeuta têm?
Enxergar que o adolescente de hoje nada tem a ver com o de ontem, já é um caminho.
Há interesse real em mudar este código de conduta?
Duvido que aja. Há alguns anos me ofereci para fazer um trabalho de graça junto a escolas públicas de meu bairro. A ideia era trabalhar o mercado de trabalho, porém sob o pano de fundo das relações éticas (aqueles que são boas para todos). Qual não foi a minha surpresa ao ouvir de diretoras e coordenadoras de ensino da rede estadual e municipal a mesma frase: Não temos tempo!
Elas desprezaram minha experiência e boa vontade. Muito menos refletiram: Ela deve cobrar caro quando faz um trabalho destes para uma entidade particular, já que trabalha com ação e não com palestras inócuas. Vou aproveitar...
O tempo, ou a falta dele é apenas uma desculpa para dizer: Não queremos mexer neste vespeiro!
Enquanto escolas, pais e adolescentes não quiserem “mexer neste vespeiro” assistiremos passivos vídeos de meninas brigando e achando que aquilo só acontece em alguns locais. Ledo engano!

Leia também: Pelo fim da maioridade penal: http://pavandesenvolvimento.com.br/textos.aspx?pagina=1&id=320