segunda-feira, 30 de abril de 2012

NÃO QUERO FALAR COM NINGUÉM


NÃO QUERO FALAR COM NINGUÉM

Suely Pavan Zanella(*)



Há momentos na vida em que é preciso o silêncio. Não são crises de tristeza, e muito menos depressão. São instantes necessários, despoluídos dos outros que às vezes, apesar das boas intenções, interrompem e até pouco entendem estes minutos ou horas de apenas reflexão. Viver sem refletir sobre as coisas que nos circundam é repetir respostas velhas e que não dar mais certo, e deixar de conversar com a(o) nossa(o) melhor amiga(o): Nós mesmos.
Refletir não é só pensar, mas também ressoar: o livro que se gosta, o filme que faz bem ou a música que nos ecoa.
Nos tempos corridos que vivemos temos poucos momentos para a reflexão. Ou será que temos, e não utilizamos de forma adequada as horas no trânsito, por exemplo, para refletir.
Nem todos têm o privilégio ou a possibilidade de parar para refletir, então temos que usar truques como, por exemplo, o do trânsito.   
Antes de escrever um texto, por exemplo, eu preciso refletir e se as interrupções são demasiadas fica difícil fazê-lo. Há textos como este que são pura reflexão, outros demandam pesquisas que levam, horas, dias e até meses. Os textos vivem no cérebro, e a cada interrupção tenho que refazer totalmente este fluxo criativo. Tanto que adoraria ter um “chip” que me ligasse diretamente ao computador. Nestas horas, apesar de ser uma pessoa bastante sociável, preciso do silêncio, e literalmente não quero falar com ninguém.
Já trabalhei em lugares barulhentos, e sempre tive que escrever, não só textos, como projetos, cursos e palestras. O que fazer? Utilizava-me de um truque. Coloquei em minha mesa de trabalho uma frase: Não interrompa gênio trabalhando!
A brincadeira da placa dava certo, até com aqueles colegas de trabalho que viviam a borboletear pelas mesas querendo contar a todo o custo seus assuntos pessoais. Para eles, sempre mais importante que toda e qualquer coisa relacionada ao trabalho.
Hoje com minha própria empresa não existem placas, e apesar de toda a minha disciplina para trabalhar as interrupções são constantes, então tenho que me concentrar.
Aliás, a reflexão é quase uma irmã da concentração. Quem se concentra foca naquilo que está fazendo através da reflexão.
Deveríamos, se isto fosse possível, usar uma plaquinha no pescoço com os dizeres: Não quero falar com ninguém!
Iria ser muito interessante observar a reação das pessoas a este pedido, e suas indagações: Será que ela (e) está triste? Será que ela(e) está fugindo de alguma coisa?.... E outras dezenas de “interpretites” relacionadas ao simples ato humano de querer ficar apenas quieta (a).
É muito interessante verificar em nossa sociedade espetaculosa que valoriza em demasia os falantes, e pouco os quietos, que o ato da quietude e de não querer falar com ninguém é simplesmente humano.  Foi através da quietude, da reflexão, que inventos foram feitos, que a produtividade em qualquer área se fez presente, e que a criação de algo novo ocorreu. O barulho tem a ver com a ação, com o resultado final, mas não com o seu processo.
A ordem das coisas, não mudou: Alguém sentiu alguém pensou, e alguém agiu.
Foi o sentimento de incomodo, por exemplo, que fez com que pensássemos numa mudança e após pensar, refletir, a ação foi feita. Mas o grande “input” foi o sentir e depois o pensar.  
Refletir sobre a vida que temos sobre o que somos nós, sobre o trabalho que fazemos, é saudável. Porém, um exercício solitário, não é uma discussão, um debate com os outros, é uma explosão interna.
Fala-se muito em autoconhecimento, mas ele só ocorre por meio da introspecção, do silêncio e da solidão saudável.  
Além do mais ficar consigo mesma (o) é um exercício delicioso, e nos ajuda, e muito, a verificar como queremos ser tratadas (os) pelos outros.

(*) Este texto poderá ser utilizado em outros veículos desde que se mantenha a autoria e a forma de contato.