TRÁFICO
DE PESSOAS NO BRASIL
Suely Pavan Zanella
A
novela Salve Jorge de Glória Perez aborda um tema bastante preocupante: O tráfico
de pessoas.
Uma
realidade que assola vítimas invisíveis à maior parte da sociedade: Mulheres
pobres e com baixíssima escolaridade (*). Vítimas que iludidas ou coagidas caem
nas garras dos traficantes. Normalmente mulheres aparentemente confiáveis que
aliciam as suas vítimas em locais pobres.
Segundo
o Ministério da Justiça o tráfico de pessoas é:
O recrutamento, o transporte, a
transferência, o alojamento ou o acolhimento de pessoas, recorrendo à ameaça ou
ao uso da força ou outras formas de coação, ao rapto, à fraude, ao engano, ao
abuso de autoridade ou à situação de vulnerabilidade ou à entrega ou aceitação
de pagamentos ou benefícios para obter o consentimento de uma pessoa que tenha
autoridade sobre outra para fins de exploração.
Em
dezembro de 2012 o jornalista Roberto Cabrini fez uma excelente matéria sobre “Venda
de Pessoas” em seu programa Conexão Repórter.
Nesta
matéria mães vendem seus filhos ainda bebês a uma aliciadora influente em uma
pobre região do Brasil.
A
pobreza aliada à ignorância e à promessa de ganho financeiro torna o tráfico
humano relativamente fácil para aqueles que dele vivem.
Fico
imaginando a quantidade de pessoas desaparecidas em nosso país e que por falta
de uma investigação efetiva não foram vítimas deste tipo de tráfico. Jovens que
“caíram” na ilusão de serem modelos no exterior. Crianças que foram
sequestradas para serem adotadas por altas quantias em países europeus...
Toda
a vez que assisto à novela Salve Jorge, porém uma dúvida paira sobre minha
cabeça: Como uma pessoa pode cair num golpe destes?
E
logo me veem à mente algumas cenas que presenciei quando estive num Congresso
em Recife em 1999.
Para
transitar pela cidade eu contratei um motorista de táxi, o Davi. Uma figura que
conhecia muito bem os meandros da cidade e sempre nos contava histórias sobre a
realidade cultural e a pobreza existente no interior de Pernambuco.
Logo
que cheguei à cidade fui surpreendida por um grupo de garotas, que não passavam
de 12 anos, dançando alegremente na porta do hotel em que me hospedará.
Ao
comentar o fato com David ele me disse que Recife era uma cidade com alto
índice de prostituição infantil. Não sei se hoje ainda é assim, mas cansei de
ver cenas de meninas e meninos nas ruas de Recife prostituindo-se às vistas de
qualquer um. E também não vi nenhuma entidade ou policiais reprimindo o fato.
Um
dia resolvi perguntar ao David por qual razão isto acontecia por lá.
A
resposta da David me surpreendeu. E talvez acadêmicos e donos de entidades em
defesa de menores, ao invés de fazerem conjecturas teóricas à respeito do
assunto, devessem botar o pé na lama ou na seca nas cidades interioranas do
Brasil. Em que somente a televisão dá acesso “a um outro mundo”, normalmente
glamouroso e cheio de oportunidades. Locais onde não há escolas, em que
autoridades policiais são omissas ou mancomunadas com exploradores como se vê no
filme “Anjos do Sol”, e em que prevalece a pobreza, a ignorância e obviamente o
desespero.
A
TV, nestes locais, deve parecer mais colorida do que realmente o é.
David
me disse que quando ele, um simples motorista de táxi, chegava à sua cidade natal
no interior de Pernambuco era imediatamente assediado por dezenas de garotas
simplesmente por ter um táxi. Ele me disse que estas meninas viviam a ilusão da
novela em que moças pobres são “salvas” de suas precárias condições financeiras
por homens apaixonados.
Todas
sem exceção, segundo ele, esperavam o mocinho salvador que viam na tela da TV.
E desta forma caiam facilmente nas garras de homens estrangeiros que as levavam
a um motel e com elas ficavam o dia todo a troco de míseros reais. E depois as jogavam
fora pelas ruas de Recife.
Ele
citou inclusive o nome da novela que passava na época, e que de certa forma
reforçava esta ilusão. Cabe ressaltar que em 1999 não havia reality shows em que marombados e popozudas
ganham carros, prêmios e dinheiro fácil.
David
ainda me disse que qualquer um que se oferecesse para levá-las para o Recife em
troca de promessas de estudo e até de casamento teria esta menina em suas mãos.
Vendo
esta realidade dura fica fácil entender por qual razão aceitar um convite para
trabalhar no exterior seja tão tentador. Isto significa sair de uma vida miserável
para ingressar em uma digna.
As
protagonistas do tráfico de pessoas no mundo real em nada se parecem com
Jessica ou Morena de Salve Jorge. Mas espero que a novela, através de seu
imenso acesso, sirva de alerta a estas meninas e meninos do Brasil, que vivem
isolados em lugares paupérrimos e que são invisíveis à maioria dos demais
brasileiros. Que a TV faça o seu papel de mostrar a dura realidade dos
traficados, ao invés apenas de iludir com promessas de ganhos mirabolantes.
SAIBA MAIS (*):
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