segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

A DIFÍCIL ARTE DE RECONSTRUIR A VIDA

A DIFÍCIL ARTE DE RECONSTRUIR A VIDA

Suely Pavan Zanella (*)


Um antigo comercial do Banespa dizia algo assim: “Duro não é subir na vida, mas sim descer”.
Na semana passada fomos surpreendidos por um desabamento de três prédios no Rio de Janeiro. Com ele pessoas morreram e outras perderam os seus patrimônios. Hoje famílias e amigos choram os entes queridos que se foram nesta estúpida tragédia. Pessoas que foram trabalhar ou estudar e que nunca mais voltarão às suas casas. Por lá haverá um espaço vazio e que demorará muito tempo para ser elaborado. Nestas situações as perguntas mais freqüentes são: Mas porque isto foi acontecer? O que eu fiz para merecer isto? Como vou viver daqui para frente?
Este vazio é dolorido e demora muito tempo para passar. Alguns conseguiram enterrar seus mortos, e outros ainda esperam que os corpos sejam encontrados. O ato de enterrar é um fechamento simbólico, uma constatação: Sim, o ser amado se foi e nunca mais irá voltar. E é duro lidar com o “nunca mais”, principalmente quando ele é abrupto.
Estas pessoas precisaram de um tempo enorme e de muita ajuda para se recuperar. Lembrando que nos processos normais de luto ( aqueles que não foram negados) a ferida se fecha, mas a cicatriz permanece por muito tempo a doer. É quase impossível esquecer tragédias como estas.
Talvez chegue um dia em que eles se perguntem: Mas tinha mesmo que acontecer isto?
E aí cheguem à conclusão que não. Que alguém, deixou para lá, banalizou e fez o que não devia fazer. E para variar não pensou nas conseqüências. Há um comportamento por parte do brasileiro que é bastante perigoso que é o tal do “jeitinho” e a abominável mania de não querer gastar dinheiro. Uma vez estava na padaria tomando um lanche e vi uma tomada elétrica repleta de benjamins (extensões elétricas) literalmente coladas à chapa que fazia sanduiches e grelhados. Ao ver aquilo, avisei o rapaz que me servia, ele muito bravo apenas me respondeu: Não tem perigo nenhum!
A apatia diante do perigo foi compartilhada por todos os presentes e que viram como eu a tal tomada, mas não se importaram.  Acho muito estranho este comportamento típico das pessoas erradas de ficarem “ofendidinhas” quando fazem algo errado. E também este comportamento “bem brasileiro” de não evitar tragédias. Brasileiro é reativo, chora depois que as desgraças previstas acontecem, mas não se indigna para evitá-las. Tudo mostra que no caso do Rio de Janeiro houve alterações do prédio sem a devida autorização, mesmo assim os envolvidos negam o fato. Num país descente estas pessoas responderiam por homicídio, e a tal padaria (que nunca mais botei os pés) por tentativa de assassinato. Tragédias podem ser evitadas sim, basta não praticar a omissão compulsória e renegar os problemas normalmente visíveis a olho nu. No Rio de Janeiro famílias inteiras foram soterradas porque viviam sobre um lixo, bueiros explodem a todo o momento. A frase “tragédia anunciada” se tornou corriqueira na mídia, porém ninguém as evita. As fiscalizações são falhas em todo o lugar, mas o cidadão também não cumpre o seu papel de denunciar o que está errado. E desta forma é conivente.
Ontem no programa Fantástico um senhor aguardava que o corpo da sua esposa fosse encontrado e metaforicamente disse que “uma luz havia de repente se apagado”. Esta luz não precisaria ter deixado de luzir se a competência humana fosse menos preocupada em ser aceita, e mais em fazer a coisa certa. Denunciar gente que tem como “modus operandi” apenas a sua própria economia e coloca uma administradora de empresas para alterar a estrutura de um andar ao invés de um arquiteto, é uma atitude cidadã. Evitar tragédias, aliás, deveria ser um comportamento aprendido desde a mais tenra idade. Ver e nada fazer é ser conivente. Ver o erro e ficar calado é ser cúmplice. Defender o errado em qualquer instância é ser acomodado e tão maléfico quanto.
Enquanto este comportamento “almofadinha” for visto como de “bonzinho” a corrupção em todos os níveis se estenderá. E famílias chorarão seus mortos e outros buscaram refazer suas vidas materiais.
A vantagem daqueles que apenas terão que reconstruir seus patrimônios é que ainda estão vivos para fazê-los, aos demais não resta esperança alguma a não ser chorar seus mortos.
(*) Este texto poderá ser utilizado em outros veículos desde que se mantenha a autoria e a forma de contato: www.pavandesenvolvimento.com.br