O
TEMPO EM QUE DANÇÁVAMOS JUNTOS
Por Suely Pavan Zanella
Não pense você que vou escrever sobre a época dos
bailes vienenses regados a Strauss. Muito menos de dança de salão, ou da forma
elegante que os mais velhos dançavam em bailes espalhados pela cidade.
Nada disto!
Este texto versa sobre um hábito simples, não
coreografado, e que não consistia em nenhum passo marcado. Bastava apenas a
menina ou mulher, abraçar o pescoço do rapaz e ele fazer o mesmo ao redor da
cintura dela. Os passos não tinham nada de dois pra lá, dois pra cá. Tinha
gente até que dançava parada. A verdade
é que em toda danceteria, boate ou balada, depois de três ou quatro músicas
agitadas, se tocava duas ou três chamadas de “música lenta”. Toda a banda, ou
ao menos a maioria delas, tem em seu repertório músicas lentas, dançáveis,
portanto, a dois. Vi isso até no último Rock In Rio!
Acredito que o ato de não tocar mais músicas lentas em
baladas começou por volta do final dos anos 90. Ao menos em São Paulo foi
assim. Quando as baladas por aqui se tornaram segmentadas, e o ato de dançar
ganhou ou a adesão maciça das danças de salão, ou o egoísmo da pegação. E
também as baladas em São Paulo começaram a ficar divididas por idade. O que é
um verdadeiro absurdo. Dançar não tem restrição de idade, como disse certa vez
o falecido ator Raul Cortez, ao ser motivo de gargalhadas por parte dos jovens preconceituosos
ao dançar freneticamente em uma balada.
O ato de dançar
juntinho era uma excelente oportunidade de conhecer alguém. Já que durante a música
era possível bater um papo. Se o papo era bom durava mais de uma música, caso
contrário se encerrava logo de cara. Se o rapaz era inconveniente, do tipo que
só queria ficar passando a mão na garota, também era fácil descartá-lo. Ao
contrário de hoje em dia em que baladas só servem para beber até cair e fazer
campeonato de quem beija mais, antigamente o prazer era conhecer pessoas. E não é à toa que muita gente conheceu o namorado
ou a namorada em um evento assim.
A música lenta seguia com precisão os passos para se
conhecer alguém. Antes havia a paquera, e depois o bate papo. Nada era invasivo,
como nos dias atuais. Hoje temos uma nova lei sobre o estupro, em que até um
beijo forçado é considerado abusos sexual. Fico imaginando como deve ser difícil
de provar este tipo de crime, em função da beijação generalizada e obviamente
da bebedeira que virou sinônimo de diversão. Nos tempos da música lenta seria
muito fácil, e na realidade não haveria o que temer, pois um beijo forçado era
notório, e a garota normalmente, apesar da inexistência da lei, não se
acanharia em se livrar rapidamente do seu agressor. Os beijos e amassos que
poderiam ocorrer durante uma música lenta eram visivelmente consentidos por ambas
as partes. E ninguém ficava contando com quantas pessoas ficou durante a noite.
As pessoas que viveram a época das músicas lentas
tocadas em toda e qualquer balada, provavelmente são do tempo em que na
infância e na adolescência participavam de bailinhos de garagem na casa (como
na foto) de amigos, parentes, escolas e vizinhos. Estas atividades eram normais nos anos
70 e 80.
Desde que eu era pequena, a família de minha avó
materna tinha o hábito de tirar as mesas da sala e dançar após as comemorações
de Natal e Ano Novo. Como eu era muito pequena ficava com a seleção musical, uma
espécie de DJ da época.
Tudo era regado a música, tanto que sempre achei que a
vida deveria ter trilha musical. Havia música para os momentos alegres, tristes,
e também para dançar juntinho. Com o fundo musical era possível liberar a
imaginação. Bons tempos!