segunda-feira, 22 de junho de 2015

A GOURMETIZAÇÃO DAS FESTAS JUNINAS



A GOURMETIZAÇÃO DAS FESTAS JUNINAS


Por Suely Pavan Zanella

Se há um tipo de festa que me traz ótimas recordações são as festas que acontecem em junho, e por este motivo são chamadas de juninas. Fogueira, quentão, barraquinhas vendendo salgados e doces típicos, e claro, quadrilha. E quadrilha é embalada pelas músicas do saudoso Mario Zan e com gente vestida como caipira, com vestidos de chita, chapéu de palha, dentes pintados de preto e camisas xadrez. A música tocada na quadrilha também tem uma marcação própria e que começa com o caminho da roça, e passa por diferentes obstáculos, como a chuva e a cobra, alem da roda e aquele túnel, que para as pessoas altas como eu sempre foi um martírio. A dança é solta, leve e alegre. Festas juninas fazem parte do rol das tradicionais comemorações brasileiras. E são, ou melhor, eram até o ano passado (data em que eu participei da última com essas características) uma delícia.
E com esta expectativa de repetir a dose do ano anterior, lá fomos nós, eu meu marido e minha neta para a festa infantil do Esporte Clube Banespa. Na programação da festa no domingo se dizia que haveria quadrilha infantil, música e barraquinhas. Eu e meu marido ainda sonhávamos em comer o delicioso sanduíche de pernil que saboreamos no ano anterior. Ao chegarmos lá, por volta das 15:00, hora marcada para o início da festa, me surpreendi ao ver que uma espécie de tapete estava sendo colocado na região central do local onde tradicionalmente se realiza a quadrilha. Não entendi o motivo, afinal a quadrilha é dançada em toda a extensão do espaço, ou melhor, era. Minutos depois o início da quadrilha das alunas de balé é anunciado. Aí quase caí da cadeira ao ver várias meninas entrando vestidas de botas, saias jeans, lenços no pescoço. Logo pensei: OOOOO, cadê a quadrilha? Aquele negócio colocado no chão era uma espécie de palco para as coreografias (vide foto). A segunda quadrilha do pessoal do balé e sapateado (?) seguiu o mesmo estilo. Músicas como Macarenha, que é o símbolo internacional do “Não dance, apenas siga a coreografia”, e também Foot loose, que ironicamente significa pés soltos, foram tocadas em ritmo country. Sei que esta goumertização das festas juninas com a inserção constante de coreografias da música country é uma constante há alguns anos nas escolas paulistanas. Por qual razão isso aconteceu, eu não sei. Escolas, a meu ver, deveriam incentivar a soltura, a espontaneidade das crianças e adolescentes, afinal esse é o ingrediente básico da criatividade num mundo cheio de gente que só sabe copiar e colar. E danças americanas não são lá um grande exemplo para isso. Sem falar no saber cultural, nossos caipiras não tem nada a ver com a ver com a realidade country. Mas as escolas se encantam em importar modelos como festas juninas travestidas em country e halloween, por exemplo. E brevemente não estranhe, se começarem a incentivar que façamos festas para comemorar o Dia de Ação de Graças. É como se ensinassem desde pequenos as crianças a terem vergonha de nossas tradições além de valorizarem a dureza corporal.
Foi muito interessante também observar a não reação das pessoas a estas duas quadrilhas. Salvo, os pais, que obviamente tiravam fotos dos seus filhos, os demais estavam inertes. Não havia nenhum tipo de interatividade. Houve inclusive um espaço dentro da quadrilha para que as fotos fossem tiradas, como se faz no Oscar.
Depois destas duas quadrilhas, foi feita a quadrilha verdadeira, com adesão das pessoas que participavam da festa, e também pude notar como é difícil para alguns entenderem o que é o “caminho da roça”, por exemplo. Tinha gente esperando, principalmente as crianças e adolescentes, que alguém lhes mostrasse como era a coreografia. Toda a dança pode ter passos marcados, como ocorre na quadrilha e também na dança de salão, mas em ambas é saudável que haja espaço para a criatividade. Notei que tanto adultos quanto crianças ficavam esperando uma ordem superior que lhes mostrasse o que deveriam fazer.

Quando as bandas começaram a tocar, apesar de eu não ser fã de música sertaneja, notei que houve uma diferença. Adorei umas senhoras que dançavam literalmente conforme a música, e era soltas, tinham o corpo leve, em detrimento de adolescentes que a todo o custo tentavam imitar movimentos que provavelmente viam em clipes das músicas tocadas. É muito duro ver gente tão jovem e com o corpo tão duro, acredito que no futuro precisarão de um manual para transar, ou então copiarão as reações e performances dos filmes pornôs.
Já frequentei, há poucos anos, festas juninas em hotéis e clubes e nunca havia visto esta gourmetização e excesso de coreografia como vi ontem. As barraquinhas, também serviam comida chinesa, italiana, e algumas como muitos doces típicos (eu não sou chegada em doces!). Bom, aquele sanduiche de pernil também ficou na saudade, pois mais se parecia com algo pré-mastigado, além da falta de temperos e excesso de cebola, apesar do nome da barraca se chamar ironicamente Bistrô!
Minha neta que tem três anos se divertiu muito, ela ainda não foi contaminada pelo vírus da coreografia, e dançou e também correu livremente. Percebi que as crianças pequenas no geral dançam muito bem. A música entra dentro delas, e elas, simplesmente dançam.  Espero que as escolas do futuro não a tornem bitolada!

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