segunda-feira, 19 de julho de 2010

MACHISMO E DESAMOR

sUELY pAVAN
Prostitutas devem morrer! Esta foi apenas uma das frases que li no Twitter esta semana referindo-se à possível morte de Eliza Samúdio, ex-amante do goleiro Bruno. As demais grosserias e piadas são impossíveis de escrever neste texto. Foram escritas por jovens rapazes e principalmente moças que, de certa forma, justificaram o ato do assassinato em função da vida pregressa da moça. Para muita gente, ser garota de programa ou atriz de filme pornô é mais chocante que um assassinato. Piadas e frases como as que li refletem um único comportamento: machismo. E como você sabe ser machista é um preconceito. No Brasil, ele tem custado vidas. São ao menos 10 mulheres assassinadas diariamente por aqui, um índice altíssimo até em relação a outros países (*). Apesar da lei que teoricamente deveria proteger as mulheres – Maria da Penha – na prática isto nem sempre acontece. E as mulheres ficam protegidas apenas pelo descaso, mesmo quando denunciam um agressor na delegacia das mulheres. Isto aconteceu com a cabeleireira Maria Islaine, de Belo Horizonte, que apesar dos oito boletins de ocorrência acabou sendo friamente morta por seu ex-marido com oito tiros. Eliza também havia feito um B.O. cerca de oito meses antes de seu desaparecimento. Elas como tantas acreditaram na lei, que não as protegeu. É uma lei como outras no Brasil, que existe apenas no papel. Um país sério pune pessoas que fogem ao comportamento esperado, não importa se elas são famosas ou não. Mas enquanto as leis não forem cumpridas teremos casos Mércia, Eliza, Eloá, Maristela, Pollyana, Sandra e tantas outras. Os agressores machistas têm dentro deles a certeza da impunidade, e também o reforço do machismo feito pelas próprias mulheres que infelizmente justificam este “modus operandi” de alguns homens: "Ele gritou comigo porque estava nervoso"; "Ele me bateu, mas disse que não irá fazer mais"; "Ele implicou com o tamanho da minha saia e me ofendeu porque tem ciúmes"... E por aí vão uma série de justificativas masculinas que perdoam o comportamento deplorável de alguns homens. Outras chegam ao cúmulo de dizer: "Ele é assim, mas eu gosto dele"!

Infelizmente, machismo e amor são lados contrários e, tal como a água e o óleo, jamais se misturam. São incompatíveis por natureza. Um machista sente-se com mais direitos porque acha que possui algo. Trata a mulher como uma posse e normalmente se vangloria disto. Tal como um cachorro, ele demarca o seu território. Diz, por exemplo: "Não faço nada aqui em casa, pois trabalho". Porém, se esquece que para conseguir trabalhar calmamente e ganhar dinheiro tem uma esposa devotada que faz compras, cuida da arrumação da casa, da comida que está na mesa, dos filhos e muitas vezes também trabalha. Mas ela se vira em quatro para manter a engrenagem sadia e funcionando, mesmo que ele nem sequer perceba isto. Os filmes “Shirley Valentine” e “Pão e Tulipas” demonstram como donas de casa cansadas do machismo deram a volta por cima. Uma socióloga francesa disse uma vez uma frase que nunca me esqueci: Quem ama uma mulher não a deixa exausta!

O machismo, apesar das justificativas de algumas mulheres, exaure as mesmas. É muito difícil conviver com um homem machista, mesmo quando ele não é um agressor. Toda a mulher sabe lá no seu âmago que um machista não a ama, apenas a possui e a trata como se fosse seu dono e não seu parceiro. Um parceiro não ofende, não destrata e não acha que porque trabalha, por exemplo, têm mais direitos. Ao contrário, um parceiro compartilha a vida, e com ela as tarefas daquilo que pertencem a ambos como, por exemplo, a casa. Um parceiro também não usa a mulher apenas para o seu bel prazer sexual.

Se você ler as pesquisas sobre a criminalidade contra as mulheres(*), verá que os motivos são fúteis e espelham apenas o machismo. O homem vinga-se da mulher que o contrapõe usando sua força para agredir ou até matar. No Brasil, a cada quinze segundo uma mulher é agredida. Enquanto as mulheres acharem “normais” cenas de ofensa e machismo o mesmo continuará a acontecer. Enquanto elas acharem engraçado e justificável a agressão verbal (como no caso Geisy Arruda) e até física (como no caso Eliza), casos assim engordarão as estatísticas. Enquanto elas seguirem o bordão do “Melhor acompanhada do que só”, e com isto aceitarem qualquer um apenas para não ficarem sozinhas, estarão complementando o pior lado de alguns homens. Enquanto elas não aprenderem a ler os sinais de que nem sempre estão protegidas pelas leis, e que muitas vezes é mais prudente calar e aprender a proteger-se ao invés de enfrentar o inimigo e suas tocaias frente a frente, mesmo que eles sejam pessoas famosas, notáveis e até ricas, mas que não complementam um item fundamental para qualquer relação respeitosa que é a confiança. A confiança se estabelece com o conhecimento acerca de uma pessoa, e é ela que forma um vínculo real entre duas pessoas. Na etapa do conhecimento a mulher precisa avaliar quem é aquele homem e como ele reage. Como trata um garçon e subordinados? Se os trata mal provavelmente um dia fará o mesmo com a mulher, quando for íntimo dela. Quando tem raiva como reage? Grita, esperneia, faz drama, xinga, desrespeita? Coloca-se sempre em primeiro lugar, não importa se você está ocupada. São sempre as necessidades dele que valem? Valoriza mais a relação com amigos do que aquela que mantém com você? O Macarrão, amigo inseparável de Bruno tem tatuada nas costas as seguinte frase:
“Bruno e Maka. A amizade nem a força do tempo irá destruir. Amor verdadeiro.”


Pessoalmente sempre acreditei que o machismo esconde um desejo homossexual não revelado. Machistas não amam as mulheres; se as amassem, não as tratariam mal, e muito menos as agrediriam. Em última instância caberá a nós, mulheres, a tarefa de distinguir aquilo que é ou não amor. Lembrando que amor não é uma frase solta que se pronuncia sem emoção como nos filmes americanos, mas sim através de ações amorosas e diárias que demonstram o nosso apreço pelo outro. A relação afetiva é tarefa árdua para ser mantida, e ela também não compete apenas às mulheres. O homem tem que fazer a sua parte, só assim ele demonstrará amar e desta forma não ser machista.

Quando as relações entre casais se derem com equidade, frases como as que li no Twitter não serão mais replicadas, e crimes contra a mulher não serão mais cometidos. Claro que os ingredientes chamados “lei e justiça” também deverão fazer valer na prática a sua parte. Afinal, uma sociedade precisa do cumprimento da lei para garantir segurança e vida não selvagem para os seus cidadãos e cidadãs.


(*) Dados sobre a violência contra a mulher no Brasil:

http://www.agenciapatriciagalvao.org.br/index.php?option=com_capas&view=capas&tplay=sub&capaid=7&Itemid=32

http://www.agenciapatriciagalvao.org.br/images/stories/PDF/noticias/not_viol/estadosp040710_mapaviolencia.pdf

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