quarta-feira, 7 de abril de 2010

AS PULSEIRAS DO SEXO

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AS PULSEIRAS DO SEXO


Suely Pavan

Você já deu beijo de língua? Você está apaixonada por algum menino aqui da escola?...Estas eram algumas perguntas que constavam dos cadernos de recordação que circulavam entre as meninas de antigamente. O caderno era composto de diversas perguntas, cada uma numa página, e as diferentes respostas das meninas compunham uma gama variada de explicações a cada uma delas.
Depois vieram os animais virtuais, os tamagotchis, os tais bichinhos tinham que ser alimentados, senão morriam. Professoras ficavam “loucas”, com os alunos que tinham o apetrecho pendurado no pescoço durante as aulas.
Ambas as brincadeiras tinham um aspecto bem ingênuo e divertido. E na maioria das vezes, ninguém saiu ferido por brincar destas coisas, salvo quando algumas professoras não gostavam do tamagotchi ou quando uma mãe bisbilhoteira fuçava em nosso caderninho de recordação.
Meninas suspiravam e recordavam por dias o beijo recebido do menino que gostavam e meninos se limitavam a ficar olhando apaixonadamente a meninas que gostavam na porta da classe. Estes romances platônicos alimentavam a vida e a tornavam mais bela.
As danças com o passar do tempo foram mudando, mas sempre houve a paquera e os “amassos”. Adolescência era a época de fazer parte de um grupo, interessar-se por pessoas do sexo oposto ou do mesmo, dar uns beijos e apaixonar-se muito. Sexo? Ele ficava para mais tarde. E antes de fazê-lo, mesmo com toda a emancipação sexual após a década de 70(aqui no Brasil), pensava-se muito. Era preciso escolher, namorar e confiar no rapaz. Tudo levava um tempo, tal como quando se come um grande jantar. Tempo para temperar, tempo para cozinhar, e finalmente comer o bom prato. Educação sexual baseava-se em escolhas e responsabilidade e não no aparato: camisinha, DST e AIDs.
Em 1998 os meninos da rua onde eu morava queriam dar uma festa e precisavam de uma garagem e os pais não queriam emprestá-la. Por não ver nenhum problema resolvi emprestar a minha para eles, e os ajudei a organizar a festa. Eles foram colaboradores e no sábado logo cedo ajeitaram a garagem e se prontificaram a recolher dinheiro para os salgadinhos e bebidas (não alcoólicas) para mais tarde. Logo de cara notei que eles muito mais do que elas se prontificaram a ajudar. Elas se limitaram a sentar no sofá e sem nada fazer ficavam esperando as ordens deles. Como eu era a única adulta e motorista os levei para buscar as coisas para a festa. Numa das viagens uma garota nos acompanhou no carro. Ela fazia questão a toda a hora de dizer pra eles: Se você quiser meu buraquinho eu te dou. Eles nem sequer respondiam, apesar da insistência dela.
Achei aquilo muito estranho a princípio, até porque a menina devia ter uns treze ou catorze anos.
À noite eles começaram a chegar à minha casa, eu havia me arrumado, afinal haveria uma festa em casa. Elas estavam com a mesma roupa usada o dia inteiro, e eles mais arrumados.  Os meninos disseram pra mim: Você é a mulher mais linda desta festa, está arrumada e muito bonita!
Elas passaram a noite debruçadas nos meninos, e entrando e saindo de minha casa em busca de bebidas alcoólicas nas lojas de conveniência próximas. Quando percebi o “jogo” sacana delas resolvi proibir a entrada: menores e bebidas nem pensar. Proibição clara. Adultos têm este dever, nada de fazer vistas grossas pra bebedeiras dos adolescentes em sua própria casa. Terminada a festa os meninos ficaram me contando na sala e alguns até choravam dizendo: Estou tão apaixonado por ela, e ela só quer ficar, eu quero namorar!
Faço atualmente um trabalho com pré-adolescentes sobre sexualidade e encontro o mesmo comportamento: Elas apesar da pouquíssima idade, 11 a 13 anos, querem um comportamento mais sexual por parte dos meninos. Eles ao contrário, me procuram para perguntar coisas sobre namoro e amor. Elas fazem tanta pressão sobre eles, que quase os obrigam a comportar-se como Djs machões de bailes funks, ou como rappers famosos cercados de mulheres. Elas valorizam o cara com “pegada”, mesmo que ele só tenha 12 anos. Eles querem uma garota para namorar. Um total descompasse em termos sexuais. Elas são afoitas, e eles devagar quase parando. As meninas estão muito mais sexualizadas do que os meninos. Os meninos são vistos como uma espécie de objeto sexual de uso imediato e descartável se não fizerem a vontade delas.
Escrevi tudo isto apenas para contextualizar o uso das tão famosas pulseiras sexuais. Elas tem sido usadas por meninas de diferentes idades, dos 8 aos 13 anos e têm gerado uma enorme polêmica. Apesar de serem feitas de um plástico vagabundo e bem baratas se tornaram modinha entre as pré-adolescentes. Muitas meninas as usem e dizem não saber de seu significado. Acho difícil. A geração internética tem este dado sobre o seu significado de forma muito fácil em diversos sites de relacionamento. Basta também uma pesquisinha rápida no Google para descobrir o que elas significam:
 Amarela – abraço
 Rosa – mostrar o peito
 Laranja – dentadinha de amor
 Roxa – beijo com a língua, talvez sexo
 Vermelha – dança erótica
 Verde – chupões no pescoço
 Branca – a menina escolhe o que quer
 Azul – sexo oral a ser praticado pela menina
 Preta – fazer sexo com quem arrancar a pulseira
 Dourado – fazer todos os citados acima

O tema tem gerado polêmica depois de casos de estupro e outros de morte motivados pela tal pulseira. A quem acredite que uma simples pulseira não pode motivar este tipo de delito. Sim, uma faca também não é capaz de provocar sozinha um crime! E aí se entra naquela discussão sem fim sobre a importância de dialogar com os filhos, ou cuidados com a proibição e outros blá, blá, blás.
Muitos tratam pré-adolescentes como se eles fossem totalmente zero à esquerda em termos de sexo, coisa que hoje em dia está longe de ser verdade. Adolescentes precisam fazer parte de grupos, mas os grupos hoje são bem diferentes do tempo de seus pais, é preciso não confundir alhos com bugalhos!
Adolescentes, mais do que aprender sobre DSTs, camisinhas e AIDS, precisam saber escolher parceiros e principalmente a se auto-valorizar. Vejo no grupo de pré-adolescentess no qual trabalho uma enorme insistência quanto a aprender o uso de camisinha, porém, tenho insistido (e muito) que antes de transar é preciso se auto-conhecer, saber colocar limites, e respeitar-se como pessoa, e não como um pedaço de carne e a ser comido cru. Meninas não são apenas um buraco e meninos não tem apenas um pênis, são seres integrais, e como tal devem ser respeitados e se fazerem respeitar. Noto neste trabalho que não há este tipo de orientação nem em casa, e muito menos na escola. Então o problema não é o uso da pulseira plástica, mas sim o seu significado. Andar com uma pulseirinha destas é o mesmo que ir a um jogo do Palmeiras versus Corinthians, e sendo palmeirense sentar-se junto com a torcida do Corinthians ! É chance pro azar na certa!
Educadores, psicólogos e juristas não analisam contextos  e ficam, inutilmente, discutindo o uso ou não das pulseirinhas quando o problema é mais embaixo. Adolescentes hoje sabem o que é sexo, porém não tem preparo algum para fazê-lo, e precisam ser orientados quanto as suas escolhas e os impactos em seu futuro. Um pai e uma mãe que acessam a internet têm plenas condições de saber o significado da pulseirinha e orientar a filha para não usá-la, mesmo que ela chore e diga que perderá as amiguinhas da turma. Talvez ela aprenda que está andando com a turma errada. Qual é a dificuldade dos pais em serem “caretas” e dizerem não?  
Não dá pra contemporizar. Uma pulseirinha é apenas uma pulseirinha, mas esta tem claramente uma conotação sexual. Se uma mulher adulta usar a tal pulseira, e souber o seu significado ela saberá arcar com as conseqüências, um adolescente não. Cabe os pais dizerem claramente que a filha está se oferecendo aos rapazes, e que eles também não devem ceder a este “chamamento” forçado. Homens não precisam agir deste modo para serem homens, mesmo que as meninas insistam neste estereótipo.  Hoje ser pai, mãe, educador e psicoterapeuta de adolescentes requer leitura de contexto social atual. Mais do que nunca eles precisam da nossa orientação clara, de nossos “nãos” bem dados, e de nosso tempo e presença. Se eles estão perdidos devemos agradecer à nossa mania adulta de tudo justificar e dizer: São coisas de adolescentes, hahaha!

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