MINHA
CULPA, SEMPRE MINHA CULPA!
Suely
Pavan Zanella
Por
que você não me avisou? Você deveria saber! Você deveria ter feito! Você
deveria ter visto isso!
As frases acima denotam uma cobrança sobre algo que
alguém deveria ter feito ou se prevenido a respeito. Porém no sentido deste desse
texto elas têm um sentido diferente, ou seja, o de se dar culpa e/ou
responsabilidade sobre quem não a tem!
Certa vez minha ex-chefe me enviou para a cidade do Rio
de Janeiro para executar um trabalho por cerca de três dias. No R.J. eu trabalhava
de manhã, à tarde e de madrugada, mal dormia. Quando cheguei à minha casa em
São Paulo me deparei com uma série de mensagens de minha ex-chefe na secretária
eletrônica. Em todas elas havia a seguinte frase: Onde você está? Por qual razão não veio trabalhar? É importante
deixar claro que ela sabia muito bem onde eu estava e a que horas chegaria a
São Paulo. Como naquela época eu era mais subserviente peguei um táxi e
chegando ao trabalho ela me fez a mesma pergunta. Respondi que estava no R.J. a
pedido dela. Ela disse que sabia mas gostaria que eu estivesse também ao mesmo
tempo em S.P.. Disse em tom bem humorado que apesar de ser geminiana eu não
conseguiria estar em dois lugares ao mesmo tempo. Ela percebeu a incoerência de
sua ação, ficou sem graça e nunca mais me pediu coisas absurdas.
Respostas bem humoradas às vezes resolvem em situações
assim, mas nem sempre isto ocorre. Culpar o outro por coisas impossíveis é
sempre irracional. Quem culpabiliza normalmente apenas quer se eximir de sua própria
responsabilidade, quer tirar o “corpo fora”, ou seja, fazer isso não passa de
um jogo psicológico perigoso. Por exemplo, “Como você não viu?”, quando a
responsabilidade é daquele que deveria ter procurado alguma coisa e não o fez,
e invés de assumir a culpa/responsabilidade busca se eximir dela culpando o
outro. É irracional este jogo de culpa!
Meu pai dizia que para algumas pessoas você pode dar
seu corpo, sua alma, mas ainda é pouco. E que com estas pessoas não adianta
questionar, reclamar, que elas sempre acharão que você é o culpado/responsável,
não importa o que você faça, explique, se desculpe ou justifique. Simplesmente
não importa, nunca está bom!
Independentemente de seu partido
político ou de gostar ou não da presidente da república, já notei que tudo, absolutamente
tudo é culpa da Dilma. Ontem, por ocasião do velório e enterro do candidato à
presidente Eduardo Campos, li uma frase no Twitter do Rafinha Bastos que
elucida bem o que escrevo aqui: Se a
Dilma ñ tivesse ido no enterro, teriam xingado. Ela foi, xingaram. No próximo
ela cria uma nova opção e aparece em holograma.
Alguém respondeu ao Rafinha que
mesmo que ela tivesse aparecido em um holograma seria culpada do mesmo jeito! E
é exatamente isso que acontece na vida o tempo todo. A Dilma elucida bem o tema
que exploro aqui. A culpam, ou melhor, a responsabilizam por coisas que não
cabem à ela, já que a mesma é presidente da nação e não prefeita, governadora,
membro do congresso ao mesmo tempo.
Atrás disto está um fator muito importante:
O machismo, já que normalmente as mulheres são mais responsabilizadas no dia-a-dia
do que os homens.
Onde está a minha meia? É pergunta corriqueira feita pelos filhos mais velhos que ao invés de procurar
perguntam à suas mães detetives-bússolas, na visão deles! Se a mãe não sabe é logo responsabilizada: Como assim você não sabe?
Os psicólogos de botequim vão
dizer que a culpa (sempre ela) é da pessoa, e não daqueles que há a responsabilizam
por tudo ( e novamente eles se eximem da culpa)!
Na realidade a culpa (?) ou
responsabilidade é da forma em que são estabelecidas as relações no contexto
social, por exemplo:
1)
Mulheres é que devem saber onde
tudo fica na casa, como se os homens não passassem de turistas!
2)
Selecionadoras nas empresas
precisam prever tudo, absolutamente tudo o que os candidatos irão fazer no ambiente
empresarial, como se fossem videntes e a responsabilidade em um processo seletivo
não coubesse à parceria entre o contratante e o setor de seleção.
3)
Se um filho adolescente tem falha
de caráter ou mau comportamento na escola, a culpa é da mãe que não soube educa-lo.
A culpa não é nunca das redes sociais que ele frequenta, das péssimas amizades
ou do pai!
4)
Até uma presidente da república
do sexo feminino precisa estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Esta
cobrança jamais aconteceria ou aconteceu quando os mesmos eventos ocorreram com
homens, mesmo quando se tratavam de verdadeiros crápulas.
O contexto social é que demanda
as expectativas sociais, e precisamos estar atenta ao que ele diz, mesmo quando
fala o contrário em um discurso politicamente correto. A carga pesada para os
papéis sociais femininos é altíssima, e não é à toa que elas vivem com dores
nas costas, fibromialgia e câncer no seio.
O que fazer então?
Bom, em primeiro lugar e como
dizia um consultor amigo meu, assuma que a culpa é sua na imaginação: Pegue um garfo
e falseando um auto-ataque diga: Minha culpa, minha culpa, minha máxima culpa. Às
vezes em nossa imaginação e levando o aparentemente sério (lembre-se que essa
cobrança advinda do outro é irracional) na brincadeira podemos fazer muito pela
nossa sanidade mental. Já que não adianta nada justificar, se desculpar ou explicar
àquele que não quer entender. Mesmo que você assim aja será mesmo culpada por
tudo.
Em segundo lugar busque mudar
estes estereótipos sociais que apesar de antigos estão cada vez mais presentes
no mundo contemporâneo. Veja o número de agressões contra a mulher, até em função
das roupas que ela veste! E esta mudança só se dá através da educação em casa e
na escola. Pais e escolas que perpetuam preconceitos são sim os maiores
responsáveis por este modo de agir culpabilizante. Que apenas exime a
responsabilidade daqueles que de fato a tem.
E se nada der certo siga outra
dica do meu colega consultor. Escreva num quadro na parede a palavra FODA-SE em
outro idioma (pode ser grego ou sânscrito) e a cada vez que alguém te culpar de
algo que você não tem culpa, faça cara de culpada, mas olhe a palavra no
quadro. Nem sempre podemos mandar o outro para aquele lugar, mas sempre podemos
imaginar fazê-lo. Isto é sanidade mental!
Não adianta tentar explicar algo a
quem não tem o menor interesse em entender.
E se você tem a mania de assumir
todas as culpas da face da Terra faça um favor a si mesma: Lembre-se de que um
dia você irá morrer e muito daquilo que te responsabilizaram permanecerá exatamente
do jeito que está ou terá que ser assumido ( finalmente) por aqueles que têm a
responsabilidade de fato. Faça-se de morta ou surda de vez em quando.
Este texto não é politicamente
correto, pois visa a saúde mental. E às vezes estes dois conceitos são
incompatíveis.
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